segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

As palavras

Os dias estão de um jeito que até as palavras, andam fugindo de mim. De modo que não sai frase significativa. Até mesmo os pensamentos soam ocos e vazios. E se estendem ad infinitum como num quarto cercado de espelhos. Um jogo de reflexos que não dá em nada. E a menor possibilidade de se articular algo lógico as palavras batem asas numa rapidez que eu não consigo alcançar. Correm de mim como todo resto do mundo. Eu durmo e acordo pensando em escrever algo que seja passível de algum sentido, mas, vejam só, não sai nada. Armaram todas de ficar em silêncio. Malditas e traiçoeiras são as palavras, porque me abandonam quando eu mais preciso delas.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Procura-se esperança desesperadamente...

"Pra onde foi a minha inspiração? Cadê? Uma preguiça de acordar. Uma preguiça de tomar banho, escolher uma roupa, escolher entre bolo de chocolate e suco de laranja. Tudo parece ter o mesmo gosto falso de paliativos. De forte somente a preguiça de contar de tantas preguiças. Da cartilha do sucesso, que manda estudar, amar o que se faz e se relacionar bem, apenas amei. Nem isso faço mais. Sou uma péssima aluna. 
Tenho a impressão de ter chegado ao topo de uma montanha, mas ela era muito alta e afastada e ninguém me viu. 
Em vez de sucesso sinto segundos desejáveis de suicídio, vontade de pular lá de cima da montanha com o dedo desejando um último foda-se ao mundo. Nem que seja para fazer barulho e sujar o chão dos equilibrados. Nem que seja para fazer falta. 
Cadê o gosto intenso de fugir do mundo com um segredo fatal? Não existem segredos fatais: todo mundo come todo mundo por caça e infelicidade. Somos animais tristes e não seres loucos e apaixonados. Eu me enganei tanto com o ser humano que ando com preguiça de me entregar. Ninguém tem coragem pra mudar nada, ou apenas é inteligente para saber que a rotina chega de um jeito ou de outro, não adianta se mover. 
Pra quem faço falta e aonde me encaixo? Aonde sou útil e pra quem sou essencial? Pra onde vou e aonde descanso? Pra quem e por quem vivo? 
Freud mexeu três vezes no túmulo com a vontade de me dizer que devo viver por mim. Dane-se a psicanálise: é muito mais gostoso ter outros encantamentos, além do umbigo. 
Não que esses encantamentos não sejam para agradar meu umbigo. Ok, fiz as pazes com Freud, que deve achar o egoísta um pouco menos doente que o depressivo. 
Ou não, não fiz as pazes com Freud, que acha tudo farinha do mesmo saco e nem está prestando atenção em mim. Ele é só mais um a não enxergar o alto da montanha, mesmo porque ele está embaixo da terra. Incluo Freud no meu "foda-se o mundo". Que papo é esse? 
A esperança desesperada por amor e reconhecimento profissional deixou escapar a cansada esperança que se assustou de desespero.
Perdi meu deslumbramento, a válvula propulsora da vida que tive até aqui. 
Cansei de me encantar pelo difícil. Que tal um homem e um salário de verdade pra viver uma vida de verdade? Chega da miséria do sonho. 
Chega de idealizar uma vida com um fone no ouvido. Eu quero tocar, eu quero cair das nuvenzinhas acima da minha cabeça. 
Junto com meu deslumbramento, perdi boa parte de quem eu era. Boa parte tão grande que não tenho para onde ir. Sou uma sem-vida. 
Junto com o meu deslumbramento, perdi o rumo: quem não sonha não sabe aonde quer chegar. O sonho guia, leva longe. Mas de frustrado ele te faz retroceder alguns anos, te transforma em criança assustada. Sei disso quando durmo em posição fetal querendo ser devolvida ao quente da minha proteção primária. Freud volta a ser meu amigo. 
Minha esperança é que o sonho esteja apenas cansado e depois de uma boa noite retorne colorido, musicado e perfumado. Eu disse a minha esperança? Então eu ainda tenho alguma? Nem tudo está perdido. 
Estou deslumbrada com a vida, que te devolve à infância quando o mundo adulto atropela e fere. Lá na infância você se enche de sonhos e volta preparada para o mundo adulto, que se ocupa a frustrá-los todos novamente. 
Eu disse que estou deslumbrada? Não, eu não disse, eu escrevi. Que papo é esse? 
Entre idas e vindas me resumo feliz. Entre altos e baixos me resumo equilibrada. Sendo assim, tá na cara e não tem pane: ando meio mal mas vou sair dessa."

(Tati Bernardi)

Pouco importa diminuir o que se sente


Deixemos de ser eufemismos de nós mesmos. Até porque nossas vidas e nossas dores são pessoais e intransferíveis. Ninguém pode viver ou doer por nós. Logo, pouco importa diminuir o que se sente.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Quando a pedra vira vidraça

Como diria Cazuza, quero uma ideologia para viver. Mas, não são meus inimigos que estão no poder. Grande parte de nós é corruptível. Alguns são mais, outros são menos, mas poucos resistem ao teste de ter em mãos o poder. Critica-se demais um adversário ou outro, mas, tendo oportunidade, muitos pegam o atalho das atrasadas atitudes dantes criticadas. Todo mundo tem discurso bonito quando é pedra, entretanto depois que vira vidraça, já era. Continua-se com velhos e expurgáveis vícios de quem até ontem era o outro lado. O outro lado não existe mais. Quem não era, agora é. Quem já foi ainda ronda e nunca deixará de ser. Não aceita. E tudo não passa de uma infindável dança de cadeiras, com semelhantes bundas confortavelmente sentadas. Ainda são homens, ainda são brancos. Estão mamando de um leite que jorra sem fim sempre para as mesmas bocas, de onde só se saí para dar lugar aos braços direitos e aos demais membros. Tudo nos custa tão caro. E alguns anos são o suficiente para não se fazer nada ou para fingir que fez alguma coisa e, através de conchavos se manter ali ou aqui . Vale a velha fábula de que quem tá dentro não sai e quem tá fora quer entrar. Enoja como no tempo das aristocracias. Dói mais, porque nessa gente um dia foi possível acreditar. Porém, interesses e conveniências valem mais do que qualquer luta, do que qualquer bandeira. É tudo igual e os iguais que se  aliem, que se vendam, que se troquem ou se lasquem. Cada um vale o que tem e ninguém vale nada mesmo. 

Luíza

Hoje revi uma pessoa que foi muito importante para que eu chegasse a esse mundo. Uma pessoa que mesmo mudando pouco, encanta muitos  com seu jeito singular e excepcional de personagem do realismo fantástico. Lembrei-me que, há alguns anos, havia escrito umas palavras sobre ela e seu jeito.

Luíza

Desliza até a Bahia, a cigana
Seu olhar cobre, cobra
Passeia pelos lugares que sua imaginação levava quando só existia vontade
Cria os filhos das barrigas que não cresceram e cobre com seus xales os filhos que outras barrigas lhe cederam
Traz na palavra a sabedoria, o humor, o poema
Dá no mundo uma volta
Uma cobra, um veneno e também uma cura

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

“Ou me quer e vem, ou não me quer e não vem. Mas me diga logo para que eu possa desocupar o coração. Avisei que não dou mais nenhum sinal de vida. e não darei. Não é mais possível. Não vou me alimentar de ilusões. Prefiro reconhecer com o máximo de tranquilidade possível que estou só do que ficar à mercê de visitas adiadas, encontros transferidos."
Caio Fernando Abreu

Por favor, desconectem os fãs!

Existe nesse mundo um ser mais inconsequente e sem noção do que um fã? Refiro-me aquele típico fã mesmo. Que não perde um show, vai pra frente do palco passar mal e, seja lá qual for a merda que o artista faça, ele sempre acha tudo lindo. Se o fã é uma adolescente aí é que é uma verdadeira bênção. Pra melhorar tudo, hoje em dia, estão elas vivem cheias de aparatos digitais. Fudeu! 

Em meu tempo de pré-adolescente, o máximo que eu poderia fazer era recortar e colar fotos do meu artista predileto na agenda na qual escrevia meus segredinhos ou em uma ou outra parede do quarto com a prévia autorização de minha mãe. Meus ídolos não tinham twitters ou blogs ou facebooks para serem seguidos e perseguidos e, mesmo que tivessem, eu não tinha computador. Eu só via seus rostos em revistas semanais que eu comprava economizando o pouco dinheiro que chegava as minhas mãos ou em programas de TV dominicais.

Esperanza Spalding
Sorte minha. Assim fui impossibilitada de protagonizar as idiotices que fazem certos adolescentes histéricos graças à internet. Soube que Esperanza Spalding – uma cantora fantástica que comecei a ouvir por indicação de uma amiga de muito bom gosto – ganhou o Grammy de artista revelação. Ótimo! Porém, em seguida, fiquei sabendo que uns anencéfalos hiperconectados, revoltados com a derrota do fenômeno teen Justin Bieber - perdedor em todas as categorias possíveis e imagináveis da mais conhecida premiação de música do mundo - insultaram de retardada pra baixo Esperanza, que aos 26 anos, simplesmente toca violino, contrabaixo, compõe e canta em inglês português e espanhol, além de ser a mais jovem professora da Berklee College Of Music em Boston. Preciso dizer mais alguma coisa? 

Por isso digo que fã é mesmo um ser carente de qualquer sombra de juízo. Porque o tal do Justin, não faz muita coisa além de pentear aquele cabelo pra frente (horroroso!) e gemer num estilo não muito diferente dos Backstreet Boys lá do meu tempo. Assim, peço encarecidamente aos pais e mães das garotas munidas de toda a aparelhagem da atual tecnology, que orientem suas filhas a guardar para si, e para suas rodinhas de coleguinhas tão fanáticas e desmioladas quanto elas, certos comentários.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Do não viver

Às vezes parece que estamos como que procurando em gavetas vazias algo que nunca guardamos. Lendo palavras jamais escritas que não deixam de povoar nossa mente. Vivendo de lembranças inexistentes. Seguindo regras que não foram ditadas. Acreditando em acordos nunca propostos. Aguardando prêmios jamais merecidos. Às vezes é assim. Dias em que se vive do não viver.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Arrumando a vida

(Um desejo às vidas novas de minhas irmãs queridas)

Que sejam carregados pra fora o peso de todas as negatividades com que se topa pelo caminho.
E que tratemos de tirar a poeira das boas coisas enquanto colocamos num baú as que já não cabem onde só se quer bem.
Que se tenha sempre tudo arejado, mas com um pouco de energia positiva depositada em cada canto e que não faltem frestas para que a luz possa entrar sempre.
Há de restar também um pouco de silêncio para ouvir o som das boas novas.
E que se arrume tudo de um jeito que não falte espaço para ser feliz.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Sexo, esse assunto agora é nosso!

Não tenho nenhum dado recente de instituto de pesquisa norte-americano, mas ouso dizer que nós mulheres falamos mais sobre sexo que os homens. É bom deixar claro que eu não sou ninfomaníaca, tá gente? Mas, anos de observação não-científica me fizeram perceber que nós  (mulheres, hetero, faixa etária de 20 a 30, sem silicone ou lipo e com internet banda larga) falamos mais de sexo do que os machos de nossa espécie com perfil semelhante. E, certamente, fazemos mais sexo também, até porque, isso que fazem alguns homens que eu já conheci e/ou tomei conhecimento da performance sexual através de umas amigas, pode-se chamar de qualquer coisa, menos sexo. Então, além de falar mais, my generation, em reparação aos anos vividos por nossas ascendentes de bocas amordaçadas pelo machismo, fazemos muito sexo. Isso porque, falamos na adolescência quando perdemos a virgindade e ficamos achando que fizemos tudo errado e que nada daquilo tem a menor graça. Falamos sobre sexo quando nos deparamos com essas revistas e sites que tentam nos ensinar com textos de linguagem esquizofrênica e ilustrações um tanto quanto fora de nossa realidade anatômica o que precisamos fazer para chegar ao lendário ponto G. Falamos de sexo no barzinho com as amigas quando sempre tem uma reclamando da ejaculação precoce do noivo, enquanto a outra fala mal do malhado que é uma negação. Falamos quando começamos a namorar e o sexo fica melhor a cada dia. Falamos de tamanhos, falamos de tempo, damos notas aos seus desempenhos, falamos das coisas estranhas que acontecem de vez em quando e das sensacionais novidades, falamos de tudo. Tudo. Então, aos homens que estão lendo esse texto, choquem-se, porque com certeza aquela amiga fiel dela sabe exatamente o que aconteceu no verão passado. Coitado! Falamos quando aparece um novo colega de trabalho lindo, forte, bem vestido e sensual, que dá mole pra todas e acaba não pegando nenhuma, ninguém sabe por quê. Ai como falamos, desejamos, sonhamos. Falamos quando acabamos passando meses em abstinência, por opção ou por falta. Falamos quando a relação chega ao ponto da coisa rolar de forma mecânica, parecendo filme com roteiro mal escrito e sem emoção. Falamos quando eles brocham e não querem falar sobre isso. Falamos quando o relacionamento acaba e sentimos falta daqueles que sabem exatamente quando, onde e como a gente quer. Falamos de fantasias, planos mirabolantes e desejos de ménages. Pois é, falamos muito, muito mais. Os homens, enquanto isso, devem falar de carros rebaixados e bombas para parecerem cada dia mais malhados. Sexo agora é assunto nosso.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Acreditando nisso...

“E sem o seu trabalho o homem não tem honra 
 E sem a sua honra, se morre, se mata.
 Não dá pra ser feliz.”

da música Um homem também chora, de Gonzaguinha

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Apagados e desinformados

(Foto: Marco Aurélio Martins/Agência A Tarde/AE)
Simplesmente apagamos. Sem mais, nem menos, nem mais ou menos. Passava das 23h da noite de ontem (3), quando oito estados da região Nordeste ficaram sem energia. Na hora que tudo desligou repentinamente eu não sabia se aquilo acontecia apenas em minha rua, em meu bairro ou em minha cidade. E o que me matava era a ausência de qualquer informação. Devo confessar que foi mais chocante não ter como saber o que acontecia do que estar no escuro. Somos mesmo viciados em informação. Venderia minha alma sem pedir troco, para ter um celular com acesso à internet naquele momento. Da janela da cozinha, eu e minha irmã caçula conseguíamos identificar que, também estavam sem luz, uns cinco bairros a nossa volta. Numa tentativa frustrada de alguma notícia sobre o que havia acontecido, começamos a ouvir o rádio pelo celular, mas não encontramos nenhuma rádio FM que tivesse deixado de tocar músicas no estilo Phil Collins para nos colocar a par do que acontecia. Estávamos ilhadas pelo desconhecimento do que ocorria e isso incomodava mais do que qualquer falta de eletricidade. Desconcertada com esse “não saber de nada”, liguei para uma amiga que mora do outro lado da cidade a fim de me informar se ela também estava apagada. Sim ela estava. Pensamos: Porra, é na cidade inteira! Mal sabíamos que era em quase toda a nossa região. O blecaute total e absoluto durou pouco mais de uma hora. Esse tempo, sem nenhuma notícia, me pareceu um dia inteiro. Com a volta da energia, corremos para internet, acreditem, as informações ainda eram um pouco desencontradas, mas a palavra apagão estava no topo no twitter e o ponto central das notícias sobre o tema, nos mais respeitados portais do país, era o atraso causado no show de Ivete Sangalo no Festival de Verão. Até nisso a mulher dá sorte, conseguiu se atrelar a notícia mais importante da madrugada, talvez da semana, com sua apresentação que homenageava o sol em uma noite sem luz. Se fosse em outros tempos, diriam que ela tem pacto com o capeta! Já que, até numa madrugada de escuridão, só Ivetão conseguia ficar iluminada.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Mais uma da série: Um dia publico um livro!

Porque também adoro esse texto.

Sem título

Sem muito esforço a claridade tomava conta de todo o cômodo cobrindo com o calor daquela manhã de sábado o lençol e quase que a forçá-la abrir os olhos. Ao lado dela ele ainda dormia um sono solto, que por vezes ela invejava. O lençol enrolado em suas pernas cobria apenas parte do corpo dela deixando à mostra a parte de baixo da perna, seu colo, seu rosto que incandescia a paixão da noite anterior. 

Aquele cobertor já havia acolhido suor daqueles corpos que se entregavam sincronicamente numa dança que apenas eles, na penumbra daquele quarto, conheciam, e ela desvairada sussurrou em seu ouvido palavras que jamais imaginara que seria capaz de falar, e ele a fazendo sentir o prazer de todas as formas empurrando seu corpo contra o dela numa intensidade que parecia que não tinha fim e ela a recebê-lo e a despertar nele cada vez mais o desejo de tê-la e eternizar aqueles instantes que se tornavam imensuráveis.

Suas bocas se encontravam e se desencontravam, explorando seus corpos, provando o sabor daquela paixão quente, provando daquele prazer, mostrando aos lábios, mostrando a língua e até aos dentes o gosto que tinha o corpo de cada um. Ele deu nela uma mordida dessas que chegam a deixar sem sentidos e ela matou sua sede naqueles beijos.

Logo todo o quarto estava impregnado com o cheiro daquela paixão, seus olfatos podiam provar daquele odor ao mesmo tempo em que seus corpos não paravam de produzi-lo, tanto a ponto de estarem ali a sentir apenas aquele aroma que os impulsionava a continuar a se entregar. E aquelas respirações compassadas produziam um efeito inebriante em seus ouvidos, era o reflexo do compasso de suas mentes agindo em só uma direção, esquecendo-se de tudo para viver aquele momento e nada mais.

As mãos dele passeavam pelo corpo dela descobrindo cada parte que necessitava do toque, dando voltas, acariciando, apertando e assim entregando nas mãos dele a oportunidade de torná-la mais mulher, cada vez mais e com mais força e com mais vontade, até que aquela vontade não coubesse mais dentro e precisasse sair. 

 E todos os seus poros passaram a transpirar aquele prazer infinito e intenso e já não havia mais pudor algum porque aquele momento já tinha sido tomado por uma cumplicidade que de tão grande contornava todo o espaço e os envolvia a ponto dele também dirigir a ela todas as palavras que ela precisava ouvir. Ela enfim pode se aquecer naquele fogo que queimava de dentro pra fora nele e nela, como se na vida não restasse mais nada além da intenção de ficar ali dentro até a última gota do desejo.

Ainda assim havia uma inconsciente vontade de repetir, repetir e repetir tudo aquilo para provar das mais diferentes sensações, para saborear os mais diferentes gostos e chegar a cada momento de um jeito, porque se era prazerosa chegada, o caminho proporcionava mais prazer ainda, aquele caminho no qual às vezes os dois se perdiam e não cansavam e não esgotavam e voltavam a se achar e a descobrir outras portas, outras entradas e usar delas e experimentá-las e fluir por dentro delas. 

Ao despertar naquela manhã de sábado em que o sol insistiu em acordá-la contava com um cansaço gostoso e com uma lembrança que jamais deixaria de acompanhá-la porque ainda que por vezes tivesse sido de outros, nenhum havia sido daquela maneira, nenhuma tinha aquela intensidade, nenhum tinha lhe feito acordar com aquele sabor. Quando o sol do alto do céu rasgou a escuridão que tomava o quarto ela a invejar o sono dele se virou tentando para o dela voltar, não conseguiu. Então ele veio desnudando aquela parte que ainda estava coberta em seu corpo e os olhos sonolentos dela voltaram a brilhar e as emoções todas misturadas trataram de despertar o que ainda faltava e já estava tudo pronto para explodir de novo.

Levantou com a certeza de que tudo aquilo era peculiarmente inigualável, deixando-se envolver por aquela aura de luxúria dos bons amantes e sentindo aquelas goladas de prazer contornarem por dentro suavemente o caminho para serem a partir dali inesquecivelmente sentidas. Seu coração batia na pulsação das lembranças intensas, uma batida que tomava todo o seu peito a fazendo suspirar e delirar, fazendo com que seu corpo ainda entoasse as vontades da noite anterior. 

À medida que passava para fora daquele lugar, sentia-se como as grandes atrizes ao deixarem seu mundo real e entrarem num cenário, de repente tudo passaria a ter outro sentido já que agora ela carregava consigo recordações das mais sinceras expressões que deveria cultivar para sempre.

Já com os pés na rua, o mesmo sol intenso que insistia em despertá-la, aqueceu seu corpo de mulher apaixonada com olhar radiante e então ela seguiu seu caminho. Tudo em volta parecia compartilhar com ela daquele prazer, tudo mostrava cumplicidade, tudo andava na mesma direção, nada era capaz de incomodá-la, uma grande conspiração a favor de sua felicidade.

Mas ainda que se inebriasse naquelas recordações que passavam pela sua memória como num desfile de primavera, naquela manhã ensolarada havia uma coisa a temer.  Iria ser assim pelo resto da vida, essa seria a única pena a pagar, viver incomodada para sempre com a certeza de que aquilo jamais seria esquecido, porém jamais se repetiria.

Sobre coisas que não somem da memória só nos resta encarar o destino de entregar-se a tê-las eternamente como lembranças.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Não sei de nada

Não sei quando devo sair, aonde devia ir ou porque vim.
Não sei por que não ando, por que paro e nem sei por que às vezes me mando.
Não sei por que não insisto, por que não invisto ou por que simplesmente desisto.
Não sei por que travo, por que fico como cachorro bravo, por que desço, por que cresço e quase nunca obedeço e tanto me aborreço.
Nem por que tanto mergulho, ou por que tenho tanto  orgulho, nem porque faço esse barulho.
Não sei por que não abuso, porque nunca induzo e por que mesmo sem querer seduzo.
Não sei do que não é, nem de quem não quer, não sei aonde vai a fé.
Não sei por que dessa estrada, não sei onde é a parada, na verdade não sei de nada.