quinta-feira, 31 de março de 2011

"Sou inquieta e áspera e desesperançada. Embora amor dentro de mim eu tenha. Só que não sei usar amor. Às vezes me arranha como se fossem farpas."

(Clarice Lispector)

quarta-feira, 30 de março de 2011

A TV que a gente merece

Todo país tem a televisão que merece. Por isso, a televisão brasileira, em pleno século XXI, continua dando um show de preconceitos. Sim, e não há exemplo melhor do que o Big Brother. Apresentado pelo jornalista Pedro Bial, que estava lá, na cobertura da histórica derrubada do Muro de Berlim em 1989 e agora só aparece de ano em ano para anunciar os malditos paredões com discursos fajutos e um tanto confusos para a capacidade cerebral da maioria dos brothers. 


Maria, ganhadora do BBB 11
Milhões em merchandisings, poses bonitas na beira da piscina, ensaios sensuais a cada eliminação, baixarias ensaiadas a partir de um roteiro – ninguém me convence de que ali é tudo verdade – a isso se resumem os três meses de futilidade que sustentam essa máquina de fazer dinheiro para a Rede Globo chamada Big Brother Brasil. Por lá desfilam homens e mulheres que traduzem, semana após semana, um pouco do que o Brasil gosta de ver na TV. Mulheres gostosas e burras, homens manipuladores e sagazes, homossexuais cheios de estereótipos, gente branca, gente sem assunto, gente com dinheiro. É disso que o povo gosta. E não é muito diferente de qualquer trama de ficção. Nessa edição, o médico quase ganhou, tinha a dose e a receita certas de um campeão, apostava que ela levaria o 1,5 milhão. Dessa vez, pelo menos a mulher que apesar do nome de santa entrou com fama de puta fez um pouco diferente. Carregou o show nas costas, tocou fogo no marasmo da casa onde não se vive, só se atua. Se humilhou, se embriagou, transou, dançou e, chego a acreditar que só saiu vencedora para garantir à emissora audiência até o último minuto do reality. Se não fosse por ela, mudariam de canal.

Deputado Jair Bolsonaro
Todo país tem a TV que merece e nela, diz-se o que se acha que o povo merece ouvir. Ontem, foi no CQC e hoje foi para os Treding Topics do Twitter a participação do deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) no programa que considero um dos melhores da atual programação da TV aberta. Ao responder as perguntas de um quadro do programa, o homem eleito através do voto do povo com a responsabilidade de representar os cidadãos, elaborar leis e fiscalizar a aplicação do dinheiro público, fez uma chuva de elogios aos tempos da Ditadura Militar, afirmou que jamais seria operado por um médico que tivesse sido cotista em uma universidade e que seus filhos não eram homossexuais porque ele havia sido um pai presente. Assim como se fosse a coisa mais natural do mundo expressar aquelas opiniões  ali. Como se não bastasse, ao ser questionado pela cantora Preta Gil sobre como ele agiria caso seu filho se apaixonasse por uma negra, o deputado deu uma resposta que falava sobre promiscuidade e lamentava o ambiente em que Preta cresceu, que é filha de ninguém menos do que um dos maiores gênios da Música Popular Brasileira. É loucura? Não. É a realidade racista, machista e militarista ao vivo e em cores na televisão brasileira, usando a voz de Bolsonaro e o espaço do CQC.

É assim, poderia ser diferente. Como eu gostaria. Mais educação, menos baixaria, mais realidade, menos ilusão. Mas é isso. A televisão brasileira é do povo brasileiro. Nela esse povo se reflete, se mostra, diz quem é, o que pensa e o que quer. É lamentável! 

segunda-feira, 28 de março de 2011

Bruna Surfistinha: eu não indico

Na última década o cinema nacional se reinventou e atingiu um reconhecido patamar, não só diante dos próprios brasileiros, que passaram a apreciar muito mais a produção interna, quanto diante do cinema internacional, que já lança outros olhos sobre o que se faz por aqui, haja vista as reconhecidas premiações. Nesse contexto, passou a se desenvolver no cinema brasileiro uma recorrente produção de filmes biográficos, de modo que não se passa um ano nesse país sem o lançamento de uma ou outra cinebiografia, até porque, as tramas que dão conta de narrar histórias reais parecem uma escolha certeira para rentáveis bilheterias. Por isso não foi à toa que a trajetórias como as de Cazuza, João Estrella (o Johnny de Meu nome não é Johnny), Chico Xavier, dentre outras, foram parar nas telonas do país nos últimos anos e tiveram um ótimo retorno do público.

Inevitavelmente, nem toda vida de alguém que vira filme tem mesmo tanta relevância ou dá caldo suficiente para garantir indicações e boas críticas. Algumas, mesmo com um bom elenco e nomes de peso por trás das imagens, não conseguem nos dizer pra que vieram. Um exemplo disso -  pelo menos para mim e para algumas pessoas com as quais conversei - foi o récem-lançado Bruna Surfistinha. O filme que conta a história da garota de classe média paulista que abandona a família e se torna prostituta ninguém sabe muito bem por que, não tem nada de verdadeiramente extraordinário. 

Para começar, a produção não é nenhuma grande coisa, não sei se pela história da própria Raquel Pacheco (nome real de Bruna) ou se pelos rumos dados a biografia dela pelos roteiristas e pelo diretor. O ponto de partida é um livro que eu não li, escrito pela própria biografada, mas que, pelo que vi nas críticas, foi deixado de lado pelos roteiristas, pois andam dizendo que eles não colocaram no filme fatos essenciais que nos fariam entender melhor a complexa (?) Raquel. 

Em alguns momentos, achei o filme machista demais, reafirmando algumas visões bem caretas do imaginário sobre a prostituição. Em outras partes achei fantasioso demais. Num terceiro momento senti que assistia a mais uma história cheia de lugares comuns sobre ambição, drogas, sexo e etc. O filme é excessivamente egocêntrico e a história de Raquel Pacheco retratada não tem a densidade suficiente para segurar os 109 minutos de duração da trama.

Outra coisa que não posso deixar de falar é sobre a falta de criatividade no enredo, devo confessar que a narrativa linear é pra mim um verdadeiro porre, essas historinhas de começo, meio e fim, necessariamente nessa ordem, me dão um tédio incrível e não me prendem mais a tela.  Fora isso, apesar de um trabalho relativamente bom de Deborah Secco e companhia, o elenco não se dá muito, senti que as atuações estão bem mecânicas e caricatas. Além do mais, revemos mais uma vez a praga das redundantes narrações em off que ou explicam o que já está sendo visto, ou deixam transparecer a falta de confiança que o próprio diretor tem a respeito da força das imagens que mostra. Assim, não dá.

Para mim o filme é apenas uma história meio preguiçosa de uma vida que não tem nada de tão interessante pra ser dito e com uma atriz de novela das oito no papel principal para garantir sucesso nas bilheterias. Nem mais e nem menos e por isso eu não o indico.

Todo dia é dia de Ivete!

 Para ser bem realista, o show de estreia da nova turnê de Ivete Sangalo, ontem, tinha muita coisa para dar errado. A Prefeitura escolheu um lugar estranho para a quantidade de pessoas que era esperada, o palco era pequeno e o som não podia ser potente pelo risco de pôr a baixo os casarões centenários da região, além do mais, o dia não tinha sido de sol. Porém, quando se trata de qualquer coisa que envolva a atual “Rei Midas” da música brasileira, tudo acaba dando certo. Pelo menos, para estampar um sem número de matérias, produzindo ainda mais mídia positiva para a cantora.

Ainda que pareça inacreditável, a chuva fina cessou assim que Ivete subiu ao palco – relativamente -  pequeno palco montado na Praça Cayru, que jamais tinha sido utilizada para shows dessa proporção e de nenhuma outra. E eu diria que além de ter Jesus (Sangalo) no comando dos seus passos, a baiana deve ter simpatia com outras entidades religiosas, pois nenhum pingo de chuva ousou a cair do céu para atrapalhar seu espetáculo, que estava sendo divulgada por aí como o grande presente de Ivete para a cidade. Pois, como dizem os mais velhos, ela não dá um ponto sem nó.

Não bastasse ter conseguido colocar em pleno Comércio, os figurinos, o piano, o elevador e até os balões que a fizeram levitar como no Madson Square Garden; Ivete, seus patrocinadores e sua equipe ainda trouxeram Seu Jorge de terno e gravata em plena capital baiana – exatamente como em Nova York – e o argentino Diego Torres, para fazerem os respectivos duetos gravados no DVD. DVD este que, por sinal, a despeito de toda a pirataria fortemente empreendida nesse país, já vendeu mais de meio milhão de cópias. Dá pra acreditar?

Assim sendo, hoje não faltaram textos na imprensa falada, escrita e televisionada, ovacionando o brilho da cantora do momento em seu extraordinário show na terra da felicidade. Eu mesma, tendo estado lá, devo confessar que salvo pela falta de iluminação nas transversais ao local onde acontecia o evento, não há do que se reclamar da apresentação. Com um público estimado de mais de 100 mil pessoas, não vi uma briga sequer e nenhum relato de furto.  Havia espaço para todos os públicos e realmente vi gente de todas as tribos e, a presença de Ivete Sangalo no palco é indiscutivelmente uma mistura acertada de carisma e profissionalismo. É por isso que assim como ontem, todo dia tem sido dia de Ivete.

sábado, 26 de março de 2011

"O sertão é dentro da gente. E esse sertão não é feito apenas de aridez e provocação, mas também de veredas, de estações de alívio e beleza em meio à solidão."
(João Guimarães  Rosa)

quinta-feira, 24 de março de 2011

Homens de mentirinha

Vejam só eles, homenzinhos caminhando por aí com seus egos inflados e seus pintos meia bomba que não conseguem nos fazer gozar. Gastam fortunas em anabolizantes para ficarem fortes e se mostrarem para eles mesmos, porque estão todos duros e não podem nos levar nem pra beber uma água de coco. Querem usar roupas de marcas caras e continuam morando na casa dos pais até os trinta anos ou até depois dos trinta nos. Se manquem! Virem adultos! Maldita geração. Olham pra nós, mulheres, e pensam que vão comer amiga após amiga num estalar de dedos. Coitados. Acham que nós somos mesmo idiotas. Acham que nós somos tão palhaças quanto eles. E como subestimam nossa inteligência com suas cabecinhas de merda, ocas de repetir as séries no voador. Vazias de contar vantagens de briguinhas e pegas para os amiguinhos. Seus carros rebaixados não nos impressionam. Nós achamos ridículos. Tanto quanto seus vidros escuros que só servem pra quando vocês resolvem transar com a menina do condomínio na garagem do condomínio. Patéticos! Parem de dizer que não querem compromisso, vocês por debaixo dessas máscaras são muito mais carentes do que nós. Estamos fartas! Estamos rezando pra que vocês não encontrem nossos perfis no facebook e fiquem mandando mensagens idiotas. Como vocês são idiotas. Desfilando nas festas com copos de cerveja quentes, querendo nos mostrar que são o melhor pedaço de carne dos açougues que se tornaram esses eventos. Nós temos mesmo muito saco pra suportar vocês. Estamos muito bem na companhia de nossas amigas, independentes e livres de suas mentiras e chatices. Ai como mentem! Parem de mentir pra nós como mentiam para suas namoradinhas, para suas noivinhas, para essas mulherzinhas que perdem o tempo delas acreditando em vocês. Homens de mentirinha.  Queremos homens de verdade e com um cérebro em bom funcionamento. Enquanto vocês não forem capazes de se tornarem isso, só queremos diversão e, por favor, não liguem no dia seguinte!

terça-feira, 22 de março de 2011

O presente já pode passar

Sabe quando o presente parece que simplesmente não está acontecendo? Ficamos saudosos pelo passado num mantra de "ai como era bom" e ansiosos pelo futuro na linha de que a vida vai melhorar. O hoje, o ontem e o amanhã compõem uma coisa que não da pra viver, que não é vivida. É muito tarde ou é muito cedo, demora tanto e no meio desse caminho a gente não sabe exatamente o que anda fazendo. Fazendo o quê? Nada. O agora estava aqui, mas sumiu em um instante e eu nem vi. preocupada que estava com o que ia ser ou com o que já tinha sido. Como era antes?  A verdade é que não havia tempo pra que eu pensasse nisso. Maldito ócio. Escraviza nosso passado, acaba com nosso presente e transforma nosso futuro num ponto no meio de um nevoeiro estranho. O presente é negado, porque infelizmente não da pra deletá-lo. Cadê o controle remoto cinematográfico onde a gente pode adiantar algumas cenas da nossa vida? Infelizmente ainda não há tecnologia que nos impeça de viver uma coisa de cada vez. E a gente fica assim, louco pra transformar presente em passado. Passa, passa logo!

segunda-feira, 21 de março de 2011

Obama, volte sempre!

Obama veio. Dilma foi e fez bonito. Lula se saiu melhor ainda por não ter ido. O primeiro presidente negro da maior potência mundial veio ao Brasil que, pela primeira vez, tem uma mulher em sua presidência. Isso sem dúvidas será um divisor de águas na história. Um fato ímpar, desses que se estuda nas escolas. Ele jogou futebol, foi ao Redentor e, no Theatro Municipal, fez um discurso esplêndido. O resumo da elegância, na família negra mais poderosa do mundo. O presidente dos Estados Unidos ensaiou um português cheio de sotaques, elogiou sabiamente a história de vida de nossa presidenta, falou sobre temas políticos relevantes e delicados e agiu com inteligência e correção que lhe são peculiares. Sem hipocrisia. Soube chegar, soube sair, exatamente como deve ser um homem da sua importância política e com a sua reponsabilidade ideológica. As míseras vozes em protestos ocos, contra ninguém sabe muito bem o quê, se perderam em meio ao sucesso asséptico da visita da família Obama ao Brasil. Foi incrível. Parabéns Brasil! E quanto a Obama, volte sempre!

sábado, 19 de março de 2011

Tudo que eu queria hoje

Hoje eu precisava de tudo que não é nem um pouco essencial. Conversa fiada por horas. Discussões sobre assuntos sem a menor relevância. Chorar de rir de um comentário sem sentido ou uma pessoa sem noção. Comer algo que não me alimentasse só pelo prazer de estar em boa companhia. Brigar por uma besteirinha que não alterasse nada. Me desculpar de algo que não fiz. Te agradecer algo que também não foi feito por você. Só hoje, eu queria isso. Tudo que não tivesse a menor importância, não fosse fundamental, nem caso de vida ou morte, eu queria hoje.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Nosso próprio inferno e nosso paraíso

Nossa cabeça, se deixarmos, vira uma casa velha cheia de fantasmas de expressão cadavérica escondidos pelos cantos para nos assombrar a qualquer vacilo. Mas, o pior não é isso, é quando nos esguiamos medrosos por aqui ou ali, temendo um ataque súbito que nos deixe desesperados de pânico. Nossa cabeça, nosso mundo, o retiro de nossas insanidades e nossos desejos, terra inabitável ao alheio. Por mais que o mundo inteiro nos cobre, nos exija, é nossa própria cabeça que verdadeiramente nos enlouquece. É para ela que não temos respostas. É ela quem sabe quando não temos saída. Só com ela não tem desculpa, não tem engano. Não há paz. Nossa mente. Nosso próprio inferno e nosso paraíso.

quarta-feira, 16 de março de 2011

O blog de um milhão de reais

Não é o nome de nenhum curta montado por meia dúzia de alunos de uma faculdade de cinema e não é nenhum reality show americano onde jovens blogueiros tem o desafio de criar o melhor blog para faturar uma boa grana, é só a piada de mau gosto da semana, que bombou na internet essa manhã envolvendo ninguém menos que o Ministério da Cultura, o dinheiro público e a cantora Maria Bethânia.

Pra quem não sabe, a filha de Dona Canô, conseguiu 1,3 milhão do Ministério da Cultura para criar um blog chamado " O mundo precisa de poesia". Pelo que andei lendo, a proposta da página é que a cantora publique diariamente um vídeo declamando poemas, numa série de 365 clipes dirigidos por Andrucha Waddington. Agora alguém pode me explicar porque ela precisa dessa grana toda? Ok, Bethânia, eu até concordo que o mundo precisa de poesia, mas você realmente necessita de tanto dinheiro pra criar um simples blog?

Vejam só, eu que criei esse blog aqui  - super charmosinho diga-se de passagem – sem nenhum centavo e não ganho nem um pão com mortadela e um copo de coca-cola quente e sem gás pelas minhas postagens. Será que Bethânia e o MinC nunca ouviram falar em blogspot ou wordpress?

Até o momento ninguém se manifestou a favor da santo amarense e, como é virou hábito nessa era internáutica, a história foi para os  Trendings Topics Brasil do Twitter e já aparece até nos Trending Topics Mundial. E como os twitteiros de plantão não perdem tempo, já até criaram um blog para debochar da situação. Amo muito tudo isso!

terça-feira, 15 de março de 2011





"Somos feitos de carne, mas temos de viver como se fôssemos de ferro." 


 Sigmund Freud

sábado, 12 de março de 2011

Aqui é o fim do mundo!

As ondas de sete metros que varreram carros, construções e tudo mais na última sexta-feira no nordeste do Japão fizeram minha irmã caçula realmente acreditar que o mundo acabará em 2012, como foi profetizado por Nostradamus. A criança de seis anos enforcada com um cadarço na semana passada no Rio de Janeiro por uma mãe de família me faz ter certeza de que o mundo já está acabando aqui e agora, na nossa frente e estamos acompanhando tudo via internet.

Sim, são situações completamente distintas as que eu cito. Mas, é bem verdade que o fim do mundo idealizado por Hollywood, passagens bíblicas e profecias que rendem o sem número de documentários da History Chanel, com fogo, água e mais uma série de catástrofes naturais, perde feio para a desumanidade para qual caminhamos. O ser humano desistiu de "ser" humano e, para mim, não há nenhum fim mais trágico do que este.

É verdade, o mundo sempre esteve repleto de psicopatas, severas crueldades atravessaram séculos sendo ovacionadas por multidões, houve tempo em que as mortes eram assistidas por um grande público como um espetáculo tão glorioso com uma partida de futebol, porém era bem diferente. O fato é que a naturalidade com a qual estamos digerindo notícias como a do assassinato da menina Lavínia é uma mostra do quanto a barbárie está se tornando um feijão com arroz no prato de todos nós.


Imagens de tsunamis e terremotos não podem abalar mais do que uma mulher que confessa ter premeditado e asfixiado uma criança. Porque para os abalos sísmicos há de se achar explicação, bastam cálculos e estudos amparados em todos os aparatos tecnológicos. Mas para crimes dessa natureza nunca iremos obter respostas sensatas. O que leva uma mulher com três filhos a assassinar uma criança? Quantos Richthofens, Nardonis,  Eloás, Joanas e tantos outros que não ganham a mídia, irão passar por nossos olhos enquanto esperamos que o mundo se acabe em erupções vulcânicas e tremores de terra?

Cidades devastadas por tragédias climáticas são reconstruídas, as vidas perdidas são de fato insubstituíveis, mas não posso negar que me preocupa muito mais o quanto matar e morrer tem se tornado banal aos nossos olhos. O quanto a vida está valendo quase nada. O quanto nosso choque diante de crimes como esses, só dura até o exato instante em que nos distraímos lendo a próxima notícia sobre um lançamento da Apple.

quinta-feira, 10 de março de 2011

"E essa angústia. Essa ânsia de precisar de algo que não se tem. Porque os caminhos a minha frente não me satisfazem. Eu apenas sinto essa paisagem que não muda, como esses passos que andam em círculos, como esse sol que sempre volta para o mesmo lugar. Eu só queria um grito. De socorro, de agonia, de alegria ... de amor."
Federico García Lorca


quarta-feira, 9 de março de 2011

Sobre nossa verdade perdida

Você me disse que o que eu quero é impossível. Esta já é uma frase suficientemente forte pra que a gente saiba o quanto uma pessoa acha que não vale a pena mudar. Eu não vou fingir e você, pelo que te conheço, também não vai fingir por mim. Aliás, você não vai fazer nada por mim, nem por essa história. Então vamos parar de andar em círculos. Então eu não quero vestir o personagem da idiota da história. Então foda-se a história. Eu saio e deixo qualquer outra assumir esse papel, porque ele é um papel medíocre demais pra mim. E eu sou gente demais pra qualquer encenação gratuita e desnecessária. E você, eu achava que você também era gente que nem eu que só acreditava no que era de verdade independente desse mundo cheio de plástica e falsa retórica, mas você me disse que o que eu queria era impossível e me acertou com um soco de palavras que até ontem não combinavam nem um pouco com toda verdade que a gente vivia. Você só não sabe me dizer o que quer porque já vive exatamente o que quer e, ao dizer isso, você acha que me despedaça. Saiba que eu há muito tempo já não tenho nenhum pedaço. E por sorte, mais uma vez eu não terei que juntar meus cacos e tentar moldar um coração estilhaçado que caminha pra se quebrar todo de novo. Tudo entre nós era tão sincero e tão real que doía nos olhos e nos estômagos dessa gente falsa que vive relações fodidas que não me invejam nenhum pouco. Mas agora você me fala que o que eu quero é impossível e arrasa o resto de sanidade de tudo que a gente viveu. Ou a gente não viveu nada e eu sou só mais uma vez a louca na linha do trem, como sempre, renegando o perigo do machucado previsível? Não sei. As coisas que eu digo perderam exatamente o sentido no milésimo de segundo que você fez questão de me falar da impossibilidade do meu desejo de continuar vivendo uma história de verdade. E eu e você tão inteiros e tão reais com nossa intensidade comedida deixamos alguma fresta que fez tudo se esvair. Nosso céu, nosso inferno, nossa estanha guerra e nossa invejável paz, pediram licença, saíram por aí e quase não acredito que elas possam voltar. O fato é que nossa própria verdade se perdeu e eu não aceito viver qualquer outra coisa que não seja exatamente sincera. Não topo dissimular. Não é jogo, não é teatro, é a minha vida e a sua. E isso, por favor, isso tem que ser de verdade.

terça-feira, 8 de março de 2011

Tudo bem guardado

Tudo que eu vivo e tudo que eu escrevo, todos os meus demônios e minhas crises minhas neuroses e sandices todos os meus dias dourados e anis toda a minha raiva e toda a minha intrigante alegria e meu humor ácido toda minha certeza e toda minha vontade e minha verdade dolorosa dolorida toda a minha fome e a minha sede e a minha paixão e todo meu peito pulsando em prol de qualquer coisa sozinha no mundo, tudo isso perde sentido quando falo, quando mostro. Tudo se quebra e vai e já não é mais nada. E só por isso eu guardo tudo tudo muito bem guardado.

sexta-feira, 4 de março de 2011

Sobre devassas e barbeadores

Sandy virou devassa, Bell Marques tirou a barba e eu não me sinto muito bem. Esses dois últimos acontecimentos que não passam de uma bela aula de marketing, nos mostram mais uma vez que não há imagem pública que resista a um cachê bem pago. Trocando em miúdos, por dinheiro vale até vender a mãe e não dar o troco.

Isso porque, todo mundo sabe que a filha de Chitãozinho e Xororó – eu nunca lembro direito qual dos dois é o pai dela – não bebe, não fuma e casou virgem (coisa em desuso no Brasil desde mais ou menos a chegada de Carlota Joaquina). Sendo assim, não tem agência de publicidade, santo, pastor ou orixá que nos convença da devassidão da irmã de Junior. Seria mais fácil aceitar Ariadna num comercial de absorvente ou anticoncepcional do que crer nas imagens da intérprete de Abre a porta mariquinha (...), abrindo uma garrafa de cerveja num balcão. Bar e Sandy são cenas que combinam tanto quanto Amy Winehouse vestida de freira. Poupe-me!

Já o vocalista do Chiclete com Banana, depois de uma exaustiva temporada de participações em ensaios alheios a fim de promover a banda de seu filho – a qual eu não lembro o nome, mas sei que é uma meia dúzia de números fazendo referência à data de nascimento dos meninos – tirou a barba numa coletiva de imprensa essa semana. A Gilette, não contente apenas com a composição do hit tate be tate sobre estar lisinho pra ganhar beijinho, pagou para o puxador de multidões raspar a barba que ele ostentava há uns 30 anos. Assim, o cara que era feio e rico, agora tá esquisito, mais feio e mais rico. Nada mal! Especula-se que Bell ganhou dois milhões pra fazer isso e eu acredito.

Como já é de se esperar, os dois assuntos bombaram a semana inteira no twitter. Não sei se as pessoas deixarão de beber a cerveja por causa da pureza forçada de Sandy ou se irão usar mais barbeadores pelas bochechas peladas de Bell. O que eu sei, graças aos meus anos de faculdade de Comunicação e a mera observação da Idade Mídia (termo citado por meu ex professor e atual Secretário Estadual de Cultura Albino Rubim) é que: se tá rendendo comentários vale a pena. Sendo assim, congratulations Gillete e Devassa, vocês conseguiram chegar onde queriam!

Isso é carnaval de Salvador

Salvador vive sua típica efervescência carnavalesca de todos os verões com todas suas ciladas e maravilhas a se repetirem. Os artistas locais que passam o ano inteiro enchendo o bolso pelo mundo a fora em cruzeiros e madsons e lavagens francesas voltam a terra para mostrar com ajuda de um bom cenário - assepticamente estruturado por patrocinadores como cartões de crédito e cervejarias- o que eles têm a oferecer. Um ou outro bloco popular deixa de existir enquanto brota esse ou aquele camarote de luxo ampliando os níveis de segregação all inclusive da Bahia para o mundo. O cheiro de urina e dos churrascos de carne de procedência duvidosa começa a invadir a ruas transversais a maior festa de rua (?) do planeta. Famílias de vendedores ambulantes alojados nas ruas durante uma semana inteira suportando sol e chuva para conseguir algum dinheiro. As brigas, os furtos e a violência policial constituem um show totalmente a parte, com quase nenhuma harmonia. As mortes, se não acontecem no percurso do circuito não precisam ser contabilizadas. Segurando as cordas do apartheid momesco homens e mulheres tratados como bichos na função sobre-humana de garantir segurança a quem pode estar dentro de um dos blocos.  Está feito o carnaval pra ninguém botar defeito, porque basta que o prefeito entregue a chave ao rei momo cada dia menos típico, para que esqueçamos as atrocidades que ele anda fazendo com a cidade. Momo devolve a chave em seis dias, pois ninguém quer mesmo segurar esse pepino. Entre a Sapucaí e a Avenida Oceânica uma irrisória diferença. Já que aqui também se toca um mesmo enredo para turistas interessados em consumar todas as formas de pecado do lado de baixo do Equador. Enquanto artistas com rendimentos milionários enrolam em um seus repertórios que não exigem nadinha de nosso cérebro, uma turba quase invisível circula entre o filete improvisado que é invadido por todos aqueles que não têm condições comprar camisetas que num intervalo de quatro horas deixam de custar um salário mínimo e passam a não valer absolutamente nada, além de uma dor de cabeça parcelada em 10 vezes no cartão de crédito. Sem problemas, o carnaval de Salvador exibido nas telas das grandes emissoras está infestado de não-soteropolitanos, mas isso tem pouca importância. Os números são sempre recordes. As contas bancárias dos medalhões da folia estão cada dia mais abarrotadas de dinheiro. Viva!

quarta-feira, 2 de março de 2011

Ouvindo Maysa, lendo Lispector, planejando fugir do carnaval e precisando voltar a escrever aqui...
Até breve!